quinta-feira, 24 de dezembro de 2009

O Último Natal

Saudações literárias veganas,

Quero iniciar a minha tentativa de colaboração com o blogue compartilhando estes oportunos versos para essa época do ano.


Abraços!

Ortegal




O último natal


Chegou o natal dia sem par

E o peru do quintal onde foi parar?

À noite somente uma certeza

A morte aguarda-me à mesa

Não ouço mais seu grugulejo

Abro os olhos e o que vejo?


No prato

Cercado de ornamentos

Em pose indecorosa

De fato

Disfarça o tormento

De uma morte dolorosa


A este pedaço de carne

Dão cuidados e muito zelo

Mas agora é muito tarde

Já viveu todo um flagelo


Os comensais brindam,

Sem remorsos

E para trás ficam

Só os ossos


Pensam que celebram o nascimento

De alguém especial

Mas se alegram com o sofrimento

De um pobre animal


Pais, amigos, tias

Ignoram o horror

Cortam-lhe em fatias

E só sentem o sabor


Troco presentes

Finjo alegria

Não era bem esta

A ceia que eu queria

Para alguns é festa

Para outros, agonia



(suposta autora de Affonso Romano de Sant´Anna)



Versão com fundo musical e imagens no youtube:

http://www.youtube.com/watch?v=TH--KvwxYpE

segunda-feira, 7 de dezembro de 2009

História de um Matadouro

(Daniel Kirjner)

Oito horas da noite, caminho pelas ruas desertas fazendo soar as pancadas de meu salto no chão por muitas léguas. Já não há mais ninguém, pelo menos que eu saiba da existência. Só vejo uma enorme solidão, à frente e atrás. Paro, tiro minha pena e começo a escrever.

Vago meus últimos dias por sobre este planeta, poucas horas me restam de autocontrole. Sinto fome, só isso, nada mais. O alimento cessou de existir a algumas semanas, e os poucos restos de sobrevida já arranquei deste mundo deserto. Só resta a espera, loucura, desespero e, por fim... bem, não sei o que vem depois, se tudo em que acredito vivia neste local. O rebanho era enorme, farto, opulento. Alimentava-me como um rei, muitas e muitas vezes, sem jamais sentir qualquer indisposição. Era conhecido como matadouro, nome que muito me agradava e envaidecia. Grande bosta! Hoje sei que qualquer vaidade é transitória. Sempre me considerei um solitário, queria o mundo sem concorrência, exclusivo para o meu deleite, mas não existe prazer sem luta. O que esgotou o alimento não foi só a morte em massa de animais, mas também seu excesso. Por muito tempo, o banquete foi farto demais. A comida estragou e eu, confiante, voraz e exagerado, estraguei a mim mesmo.

Deixo registrado o ocorrido nas linhas que seguem, para a posteridade, ou talvez para informar alguma forma de existência racional que consiga superar a rudeza deste planeta. A humanidade sempre sacrificou animais para comer. Desde suas formas mais primitivas, a caça sempre foi a principal fonte de energia para o corpo. Mesmo depois da descoberta e desenvolvimento da agricultura isso não mudou. Particularmente, tenho uma teoria sobre esse fato: Homo Sapiens Sapiens fica facilmente entediado e a crueldade – digo por experiência própria – é a forma mais divertida de passar o tempo. De volta ao acontecido, a humanidade evoluiu, criou o shopping center e, não mais que de repente, tinha tantas coisas para fazer que não podia mais caçar. Mas isso não os fez abandonar a carne, pelo contrário, começaram a pagar para que esta fosse produzida em grandes quantidades. Claro que os animais comidos tinham vidas e, consequentemente, doenças. Tecido doente não se come, nem cresce, muito menos vira lucro. Logo os seres humanos passaram a entupir seu rebanho de remédios e quem ficava forte era outra forma de vida desprezível. Primeiro veio a gripe de vaca, depois a do frango e a do porco, mas todas estas foram superadas com menos baixas. O que liquidou tudo não foi um vírus, mas um fungo que se espalhava pelo ar e tinha grande facilidade de se reproduzir em meio à gordura animal armazenada, consumindo-a primeiro e, na falta dela, atacando os órgãos internos de seu hospedeiro.

O destino é mesmo um clichê de ficção científica. Fungos resistentes a antibióticos! Isso sim é muito engraçado. E o mais hilário é que não apareceu um Texano de espingarda para salvar ninguém e se tivesse vindo por aqui eu mesmo teria me banqueteado do sujeito. Mais engraçada ainda é a minha sina. Eu, que a mais de trezentos anos não ponho um pedaço de carne na boca, persisto como último ser da terra. Não posso me gabar de estar vivo, porque não estou, mas o fato de não respirar ou comer e estar podre e atrofiado por dentro me ajudou a continuar vagando por aí. Os fungos são meus companheiros a séculos e já cearam os órgãos que parei de usar. Você deve estar se perguntando que criatura bizarra fui, já que se esta carta esta sendo lida, há tempos devo ter virado pó. Sou um Vampiro. De certa forma, não sou muito diferente dos outros humanos que viveram na terra, aliás, já fui um deles. Ambos pertencemos a uma sociedade cruel, que se alimentou da morte de outras espécies inferiores ao nosso olhar. Caçamos, brigamos, cobiçamos, flertamos e bebemos. As diferenças são apenas duas: eles fodem para ter prazer, nós bebemos sangue; eles matam galinhas, vacas e sardinhas, nós os matamos. Não há muita diferença, afinal, entre matar uma galinha ou um ser humano. O sangue humano é mais gostoso, além do que eles sabem implorar pela vida, coisa sempre muito prazerosa e importante no ritual da caça.

Já sinto o fim se aproximar. A Besta! Um instinto destrutivo incontrolável que existe em todos os seres que estão perecendo pela fome, ela é mais forte ainda nos vampiros, nossa maldição, ante-sala do fim. Despeço-me enquanto ainda tenho o dom do raciocínio, pois para um filho de Malkav a loucura chega mais rápido. Adeus! Quem sabe te vejo no inferno.

quarta-feira, 18 de novembro de 2009

Uma Angustiante Hora do Almoço

Autor: Dennis Zagha Bluwol

(Texto presente no Zine-Livro "Escritos Éticos & Picaréticos")

Versão alterada em 30/03/2010


A tempos venho namorando o crudivorismo[1] e feito algumas experiências de poucos dias ou, no máximo, poucas semanas. Agora estou aqui, olhando para a mesa.
Hora de preparar o almoço. Serei eu crudívoro ou prepararei um arroz cozido? Dúvida angustiante. Parece-me óbvio comer as coisas como vêm, cruas, inteiras, íntegras, resultados de processos de bilhões de anos de adaptações em conformidade com as espécies que as comem. Mas meu arroz integral parece tão saudável e sempre me deixou tão bem… Será que desde o neolítico não nos adaptamos perfeitamente a nos alimentar de cereais cozidos? Mas os crudívoros não devem estar mentindo quando dizem que vivem muito melhor assim.
Parcela dos crudívoros, especialmente os vinculados à chamada alimentação viva, continuam a alimentar-se de cereais e grãos, mas germinados, não cozidos. Outra parcela diz que nossa natureza é frugívora: frutas, folhas, sementes, castanhas. Essa me parece uma dieta (um modo de vida) interessante eticamente e ambientalmente.
Eu me preocupo muito com nosso modelo de mundo, nosso modo de inserção na natureza, nos ecossistemas. Há apenas dez mil anos começamos a domesticar radicalmente a natureza e a plantar cereais e grãos em larga escala (alguns dizem que foi pra fazer cerveja. Será? Faz sentido o uso de álcool para aguentar viver a vida sem sentido que então se impôs e para causar passividade naqueles que não desejariam viver como trabalhadores rurais e não mais caçadores-coletores).
Então, o que comíamos antes? Alguns dizem que éramos frugívoros. Mas, creio eu, certamente nossos parentes neolíticos também comiam carne. E isto eu descartei já como opção.
Cereais e grãos… Alimentos da civilização? Frutos da arrogante e violenta domesticação da natureza? Será possível nos alimentar de cereais e grãos em uma relação harmoniosa com o resto da natureza? Como produzir tanto cereal e grão em uma organização que não dependa da brutal domesticação e eliminação de diversidade? Se não for possível, posso viver como frugívoro? Alguns vivem e dizem que vivem no auge de suas energias e felicidade. Será mesmo que nosso organismo ainda consegue viver assim por muito tempo? Angustiantes dúvidas. E a hora do almoço está passando… Cru ou cozido? Cereais e grãos ou frutas e folhas? Ou frutas, folhas, cereais e grãos, crus e cozidos? Dúvidas. Deveriam colocar nos livros de nutrição como fatores antinutricionais: angustiar-se com o alimento à mesa.
Como pode uma espécie ser tão perdida que não sabe nem mesmo qual seu alimento ideal? Talvez nos caracterizemos por sermos uma espécie sem ideal. Algumas são carnívoras, outras herbívoras, ninguém fica se preocupando com o que seria mais saudável comer na próxima refeição. Mas nós somos perdidos. Talvez seja esta nossa natureza. Já estamos tão perdidos que não possuímos mais uma natureza de fato. Estamos sempre em busca. Todo este desenvolvimento do nosso pensamento abstrato e capacidade de reflexão nos tornou essas coisas, sempre criando, sempre criando, e sempre perdidos, sempre em dúvida. O resto da natureza é que sofre a cada nova genial criação humana. Mas não há como vivermos sem criarmos. Seremos obrigatoriamente contraditórios com nosso próprio ecossistema? E, pior, com todos os ecossistemas terrestres? Angústia...
Como espécie, qual valor tem o fato de termos nos adaptado a comer quase tudo, cru ou cozido? É um ganho da espécie ou um ganho de obrigação de destruição e competição por alimentos que antes pertenciam apenas a outras espécies, quebrando o equilíbrio existente na diversidade? Somos algo como um vírus, nos apropriando de tudo e todos? Pior, vírus conscientes, autointitulados senhores do destino de todos os outros seres, de todos os ambientes terrestres. Ai meu estômago! Agora, além de fome, me ataca a gastrite.À minha volta há mamões e mangas (certo, com agrotóxicos e exploração dos trabalhadores rurais, transporte com combustíveis fósseis e tudo mais). Ao meu lado há também arroz e lentilha prontos para serem cozidos (com os mesmos poréns). Dentro de mim há dor.
Alguns ficariam bêbados para esquecer a angústia. Eu já aprendi que isto só a aumenta. E traz passividade e doença. Fico então olhando para a manga como se fosse um alienígena. Analisando, analisando, pensando. Ai minha capacidade analítica, como dói!
Minha existência tem fome…
[1] Crudívoros são pessoas que se alimentam apenas de alimentos crus.

domingo, 25 de outubro de 2009

Vozes Vegetarianas na Literatura: Swift


No romance satírico “As Viagens de Gulliver”, do irlandês Jonathan Swift (1667-1745), encontramos a percepção de que o vegetarianismo é uma escolha racional e virtuosa.

A narrativa inicia-se com o naufrágio do navio onde Gulliver seguia. Após o naufrágio, ele acaba sendo levado pelas circunstâncias às mais pitorescas terras. O episódio mais conhecido é, certamente, aquele em que Gulliver é arrastado para uma ilha chamada Lilliput. Os habitantes dessa ilha, que eram extremamente pequenos, estavam constantemente em guerra por futilidades. Nosso interesse, porém, está na última das viagens de Gulliver.

Em sua última viagem, Gulliver encontra os Houyhnhnms, uma raça de cavalos que possuía muita inteligência, e os Yahoos, uma raça humanóide imperfeita, de comportamento selvagem. Dentro da alegoria, os Yahoos representam o homem em sua natureza mais primitiva, e os Houyhnhnms personificam o homem em seu mais elevado potencial, atingido com o exercício pleno da razão. A diferença entre as duas raças é marcada de diversas formas, inclusive pela dieta que seguem. Os Houyhnhnms comem basicamente cereais, enquanto os Yahoos são contumazes comedores de carne. Associando-se o tipo de alimento consumido às demais características de cada uma dessas raças encontradas por Gulliver, fica clara a idéia subjacente de que uma dieta carnívora tende à selvageria enquanto um estilo de vida vegetariano se associa a maior discernimento e clareza mental.

Nas palavras do romancista:

(...) deparei com três das detestáveis criaturas que encontrara após minha chegada e que se alimentavam de raízes e da carne de alguns animais que ao depois verifiquei serem burros e cães e, de onde em onde, uma vaca, morta por acidente ou moléstia. (...) Possuíram-me um horror e um pasmo indescritíveis quando observei, nesse abominável animal, uma perfeita figura humana: tinha o rosto, efetivamente, achatado e largo, o nariz deprimido, os lábios grossos e a boca enorme; mas as diferenças são comuns a todas as nações selvagens (...). O garrano alazão ofereceu-me uma raiz, que segurava entre o casco e a quartela; tomei-a nas mãos e, depois de havê-la cheirado, devolvi-lha com a maior civilidade possível. Foi então buscar ao covil dos Yahoos um pedaço de carne de burro, mas esta fedia tanto que me afastei, repugnado, atirando-a ele ao Yahoo, que a devorou sofregamente. Mostrou-me, em seguida, uma paveia de feno e uma quartela de aveia; mas abanei a cabeça para significar que não eram alimento para mim.

A partir daí, convivendo com os virtuosos Houyhnhnms, Gulliver se acostuma com a sua dieta.

Cabe ressaltar que o vegetarianismo de Swift não é obra do acaso.

Thomas Tryon (1634-1703), um filósofo autodidata e aluno do místico protestante Jakob Boehmen, publicou, em 1691, seu livro, “O Caminho da Saúde”, advogando uma dieta vegetariana. Essa obra era amplamente lido pelos pensadores da época. Ela até mesmo influenciou o jovem Benjamin Franklin (1706-1790) a se tornar um "Tryonista" por algum tempo. A mensagem de Tryon também influenciou o Dr. George Cheyne (1671- 1743), um famoso médico de Londres. Anos de indulgência o deixaram com aproximadamente 250 quilos; assim, ele decidiu seguir a dieta vegetariana descrita por Tryon. O sucesso de Cheyne levou-o a publicar, em 1724, o “Ensaio sobre Saúde e Vida Longeva”, recomendando uma dieta sem carne. O fundador da Igreja Metodista, John Wesley (1703-1791), foi paciente de Cheyne e convertido ao vegetarianismo. Cheyne contava com outros famosos amigos, como o poeta Alexander Pope (1688-1744), o filósofo David Hume (1711-1776) e – aí está! – o escritor Jonathan Swift.

sexta-feira, 23 de outubro de 2009

O Boi

Daniel Kirjner

“Um rapaz de dezessete anos morre, vitima de Bullyng”. Uma manchete incomodou o canto da primeira página de um jornal, ou de todos. A pouca relevância dada ante a magnificência do acontecido impressionou. Um folhetim destes sensacionalistas foi o único com foto de capa, discorrendo uma matéria mais ou menos assim:

Estudante é brutalmente assassinado em Barretos.

Carlos Miguel Pereira, de 17 anos, foi brutalmente assassinado no fim de semana por colegas de turma. Seu corpo apresentava escoriações nas áreas genitais, cintura, ombros, costas e pescoço, dando sinais de asfixia. A polícia não comentou o caso, mas uma testemunha ocular, que não quis se identificar, afirmou que o acontecido foi fruto de uma brincadeira de mal-gosto por parte de um grupo de amigos (nomes serão ocultados por questões de segurança):

“Estávamos na festa na casa de B.(...), quando eu e meu amigo F. percebemos uma bagunça no quintal. Quando fomos olhar o que estava acontecendo, vimos que ninguém mais estava prestando atenção na banda country que tocava por lá. Havia uma rodinha em que estavam quase todos da festa, levantando suas cervejas e gritando. Quando nos aproximamos da roda e pudemos ver algo, ficamos os dois chocados: B. estava montado sobre Carlos Miguel, que estava pelado e preso por uma corda que lhe passava pelo pescoço e era amarrada na cintura pelo saco. Carlos urrava de dor e se retorcia, chorando sem parar. B., fingia que era pião e que estava montando nele. O pessoal em volta achava tudo aquilo o máximo. F. e eu e algumas outras pessoas saímos de fininho da festa, com medo que aquilo acontecesse com a gente.(...) Sabe, o Carlão sempre foi bem alto e bem gordo e, cá entre nós, bem devagar. Era repetente de ano e não era muito inteligente. Os caras fortinhos não deixavam ele em paz. Como ele não reagia por medo, tinha que agüentar os caras humilhando, chamando de Frankenstein, Pé Grande, ou simplesmente Boi. Mas nunca achei que fossem capazes de fazer o que fizeram”.


Um choque! Ninguém acreditava pelas ruas que jovens de classe média alta, com boa educação, haveriam de pregar peça tão cruel. Mas mesmo com a obviedade da violência, sempre surgem – de todos os lados – os advogados do diabo. Uns comentaram que era uma brincadeira, que não tinha intenção de matar, por isso deveria ser crime culposo. Aqueles jovens não tinham noção do que faziam. Suburbanos que eram, sempre foram protegidos pelos pais e jamais tiveram sentido a repercussão de seus atos. A culpa era de Holywood, dos jornais e das revistas e, principalmente, da TV e de seus heróis de ação! Afinal, de onde mais eles tirariam essas idéias?
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De onde mais eles tirariam essas idéias?

domingo, 11 de outubro de 2009

Vozes Vegetarianas na Literatura: Tolstói


O romancista russo Leon Tolstói (1828-1910) levou a cabo a experiência à qual a maior parte de nós se recusa, aquela mesma experiência considerada pelo filósofo escocês John Oswald (1760-1793) como um alerta à sensibilidade natural do homem: Tolstói visitou um matadouro. O escritor, bem como qualquer vegetariano de qualquer outra época, estava acostumado a viver em uma sociedade erigida sobre a exploração animal. Já ouvira todas as razões antigas e conhecidas pelas quais matar animais para comer é aceitável e até natural, coisas como “Deus permite”, ou “todo mundo faz assim”. A respeito disso, escreveu ele:

Não existe mau cheiro, som, monstruosidade aos quais o homem não consiga se acostumar a ponto de deixar de ver, escutar e cheirar a aparência, o som e o odor do mal.

Tal convicção reforçou-se ainda mais com sua visita ao matadouro, descrita por ele nas seguintes palavras:

(...) na longa sala, já impregnada com o cheiro de sangue, só havia dois açougueiros. Um soprava a perna de um carneiro morto e batia no estômago inchado com a mão; o outro, um rapaz de avental emplastado de sangue, fumava um cigarro torto. (...) Depois de mim entrou um homem, aparentemente um ex-soldado, trazendo um jovem carneiro de um ano, preto com uma marca branca no pescoço, de patas amarradas. Este animal ele o pôs sobre uma das mesas, como se numa cama. O soldado velho saudou os açougueiros, que evidentemente conhecia, e começou a perguntar quando o seu patrão lhes permitia ir embora. O camarada com o cigarro aproximou-se com o facão, afiou-o na borda da mesa e respondeu que estavam de folga nos feriados. O carneiro vivo estava ali deitado, tão silencioso quanto o morto e inflado, a não ser por sacudir nervosamente o rabo curto e os lados a se alçarem com mais rapidez que de costume. O soldado baixou gentilmente, sem esforço, a cabeça levantada; o açougueiro, sem parar de conversar, agarrou com a mão esquerda a cabeça do carneiro e cortou-lhe a garganta. O animal tremeu, e o rabinho endureceu e parou de abanar. O camarada, enquanto esperava o sangue correr, começou a reacender o seu cigarro, que se apagara. O sangue corria, e o carneiro começou a agonizar. A conversa continuou sem a mínima interrupção. Era horrivelmente revoltante.

Para nós, hoje, seria um alívio (ainda que um alívio questionável) descobrir que os matadouros de agora são menos “revoltantes” do que aquele que Tolstói descreve. A verdade é bem outra. A frieza com que os animais são mortos é exatamente a mesma. São diferentes apenas duas coisas: hoje, os animais são mortos em escala industrial, no que poderíamos de chamar de verdadeiras “linhas de desmontagem”, que contam com as mais bizarras tecnologias (esteiras com ganchos para suspender as vítimas, serras elétricas, tonéis de escalda etc.); além disso, os matadouros não param mais nos feriados – funcionam noite e dia, ininterruptamente, para atender a imensa e crescente demanda por carne.

quinta-feira, 1 de outubro de 2009

Olinda

Daniel Kirjner

- Mercedes, vou morrer.

- Calma Olinda. Não há motivo para perderes as esperanças.

- Esperança...só tenho uma: deixar de existir. Já se foram os últimos ensaios de juventude em meu corpo, agora eu só espero.

-Falas como se possuíste poucos minutos e não faz muito que passaste da meia-idade. Creio que a falta de luz está a fundir teus miolos. Mesmo sendo eu nova no ofício, espero a dádiva de morrer a trabalhar e não a esperar o destino.

- Pobre ingênua! Poucos meses faz que aqui tu trabalhas. Como todos os jovens, conforma-te a uma vida que não tem nada a oferecer senão um ofício mal pago. Aliás, não como todos os jovens. Alguns, de raro bom senso ou sorte, conseguem encontrar a morte já cedo. Ou pensas que este lugar vale a pena? Qual foi tua última folga? Por acaso, já ouvistes falar do Sol?

- Estamos falando sério! Não há porque começarem as zombarias. Caso não tenhamos na produção nosso fim último, que adianta gastar o tempo? E com o quê? Não me digais que queres viver como os selvagens? Entregar-te a caminhadas inúteis à luz do dia? Horas intermináveis de sono? Esse é, justamente, o elo fraco da espécie! Eu e tu, amiga Olinda, fomos feitas para trabalhar. Não precisamos de espaço de lazer ou de filosofias hippies que não são senão ardis dos preguiçosos, que passam a vida a realizar atividades vãs e nada contribuem para a economia.

- Para o inferno com a Economia! Em tua boca soa o discurso do patrão! Nós somos empregadas esforçadas e, sozinhas, produzimos sem nada ganhar em troca. O que ganhaste até hoje, Mercedes?

- …

- Diz!

- …

- Como eu pensei: nada. E, ainda questiono, quantos foram os dias que adoeceste de tanto trabalhar? Eu nada pude fazer para ajudar-te. Só observei a dor, tão grande, que consumia teu corpo. Tão jovem! A mesma dor que tantas vezes senti...

- Sem dor não há produção!

- E o que importa isso? Onde está sua produção agora? Você sabe?

- Não...

- Nem eu! E aposto que nenhuma de nós sabe!

- O que aconteceu, Olinda? Lembro que quando aqui cheguei neste lugar eras a número um, modelo para todas. Não havia quem trabalhasse mais. Não tenha medo de contar que mal a perturba, sei que algo não estás bem.

- Creio que posso confiar em tua discrição. Mas deves jurar que nada acabará nos ouvidos de nenhuma outra.

- Pois juro.

- Mercedes, já não consigo mais trabalhar. Sei que não estou muito velha, mas meu corpo já não me permite qualquer ofício. Faz três dias que dissimulo minha condição roubando das outras, mas a verdade é que nada mais tenho para contribuir.

- …

- Diga algo!

- ….

- Não cales Mercedes, estou com muito medo e...

- Inútil! Ainda pensas ter o direito à dádiva da vida! Que insolência tua dirigir-me a palavra! Nenhuma contribuição que fizeste ao nosso lugar pode amenizar a perversidade de teu ardil. Petulante! Arrogante! Agora está claro! Por isso que tu não consegues fechar o bico, enchendo os ouvidos de outras funcionárias honestas com esta lábia comunista e vazia. Sua vagabunda! Aposto que se não trabalhas, é por pura preguiça.

- Não podes falar assim comigo! Pare, Mercedes! Nós somos amigas, as outras podem escutar.

- Escutem todas! (Gritando) Escutem! Olinda não trabalha a três dias! Escondam seus pertences! Esta mal-caráter não tem pudores em roubar e mentir para sobreviver! Escondam a produção! Deixem que os patrões vislumbrem sua impotência e incapacidade!

- Não faça isto comigo, por favor! (Chorando).

- Cale-se! De hoje até o final da semana Eles perceberão sua inutilidade e não tardará que venham abrir o seu cubículo para levá-la. Gostas do sol? Pois bem! Morrerás cega, olhando para ele!

segunda-feira, 28 de setembro de 2009

O Feijão Mágico

Autor: Dennis Zagha Bluwol

Uma vez recebi uma estranha carta não assinada. Dizia que havia se afeiçoado muito por opiniões minhas publicadas em certo texto, onde expunha minha visão à favor da libertação dos animais das mãos de seus carrascos humanos. Dizia que não podia dizer por carta, mas havia um porquê muito profundo neste interesse em minha pessoa. Combinamos um encontro em um famoso parque de São Paulo.
Pequeno, com uma longa barbicha e ar bem simpático, apresentou-se como “o Gênio”. Contou-me sobre sua história de vida. Havia também vivido uma vida de clausura graças à humana sede de poder. Viveu por centenas de anos confinado em uma espécie de lamparina, sendo-lhe permitida a saída apenas para realizar desejos daqueles que a possuíram. Pedidos mesquinhos, invariavelmente, como era de se esperar.
Não me contou sobre como escapou desta condição, mas hoje vive livre, sem sair de sua pequena chácara nos arredores da cidade.
Enfim, viramos grandes amigos. Nossas conversas acerca da liberdade e da maldade humana viravam noites, regadas por inacreditáveis chás do oriente.
Após meses de amizade e convivência assídua, percebeu o Gênio que era eu um grande apreciador de feijões e leguminosas similares. Creio que, por ser brasileiro, parte de meus genes são constituídos de arroz e feijão, possivelmente interligados por finas fatias de couve e envoltos por uma grossa camada de pimenta e farinha de mandioca, mostrando, mais uma vez, o processo de adaptação entre códigos genéticos e ambientes. Mais um ponto para os Neo-Darwinistas. Como anarquista não respeito o Estado nacional, mas respeito muito um bom arroz com feijão.
Um dia, estava eu em casa almoçando quando de repente avistei um belo feijão multicolorido. A primeira impressão foi de surpresa, a segunda de medo, a terceira de gozo estético, a quarta de surpresa novamente, a quinta de emoção e a sexta de dúvida. Algo nele me chamava à mordida. Muitas cores se revezavam em um impressionante degrade. Muitos tons pareciam a todo instante se revezar. Algo em mim me levou a devorá-lo. E algo bateu.
De repente, não me perguntem como, estava em um sítio. E meu amigo Gênio estava lá. Havia me concedido a realização de um desejo. Porém, diferentemente de seus métodos da época em que era escravo, não me deixou escolher ao meu bel prazer. Achou ele mesmo nas entranhas de meus confusos neurônios algo que seria de fundamental importância para minha existência. Disse-me para relaxar e aproveitar a viagem. Achei que seu olhar tinha um quê de Timothy Leary e embarquei na onda.
Acordei em outro lugar. Um pasto. Sentado de frente para uma vaca. E a vaca olhava pra mim atenciosamente. Retribuí o gesto e olhei-a nos olhos. Havia algo de diferente naqueles olhos. Senti-me como certo aluno de certo professor-gorila. Após minutos de olhares profundos, parecia que criáramos certa intimidade. Passei a ouvir uma voz. Um canto. Uma voz feminina cantando palavras que conhecia em uma melodia que também conhecia. Para minha surpresa, a vaca deu-me uma piscadinha, como que confirmando que eu não estava ficando louco, ou talvez provando que o estava completamente. Estava realmente ouvindo o que se passava na mente daquela adorável criatura?
E eu continuava a ouvir:

I ain't gonna work on Maggie's farm no more.
No, I ain't gonna work on Maggie's farm no more.
Well, I try my best
To be just like I am,
But everybody wants you
To be just like them.
They sing while you slave and I just get bored.
I ain't gonna work on Maggie's farm no more.

Parece que possuíamos algo em comum além do fato de adorar comer folhas. Era uma fã do Dylan. Mas havia ainda algo mais naquele canto, que o fazia soar como uma work song de escravos catadores de algodão do delta do Mississipi, ou como os blues cantados por seus - ainda na miséria - descendentes. Olhei para o lado e vi a placa:

FAZENDA MAGGIE & FILHOS
– DA NATUREZA PARA SUA CASA –
LEITE DE VACAS FELIZES

Senti algo que nunca sentira antes, e pus-me a cantarolar com minha nova amiga, sentindo sua dor e ânsia de liberdade. Uma voz cantava How many years can some people exist, before they're allowed to be free? Mas outra entoava How many years can some animals exist, before they're allowed to be free?
Antes da primeira gota de lágrima, estava novamente em casa, defronte ao prato de comida. Triste, profundamente triste por saber que minha companheira de sentimento e gosto musical estava ainda em seu cárcere em algum lugar do mundo. Mas, ao mesmo tempo, feliz por olhar para meu prato, um manifesto anti-crueldade.
The times are a-changing? Eu não sei, mas incessantemente me questiono acerca daqueles que ainda alimentam-se do sofrimento alheio: how many ears must one man have, before he can hear animals cry? Se você, caro leitor, sabe que something is happening here, but you don't know what it is, the answer, my friend, is blowing in the wind. The answer is blowing in the wind.

terça-feira, 22 de setembro de 2009

Vozes Vegetarianas na Literatura: Romain Rolland


Uma das vozes vegetarianas mais fortes na literatura é a do escritor francês Romain Rolland (1866-1944), vencedor do Prêmio Nobel de Literatura.

Rolland doutorou-se em Arte em 1895, foi professor de História da Arte na École Normale de Paris e professor de História da Música na Sorbonne. Para além da sua atividade docente, foi um reconhecido crítico de música. Estreou na escrita em 1897 com a peça "Saint-Louis", que, juntamente com "Aërt" (1898) e "Le Triomphe de la Raison" (1899), fez parte da trilogia "Les Tragedies de la Foi" (1909). Em 1910 retirou-se do ensino para se dedicar inteiramente à escrita.

Na sua obra, concilia o idealismo patriótico com um internacionalismo humanista. Escreveu peças de teatro, biografias ("Vie de Beethoven", 1903; "Mahatma Gandhi", 1924), um manifesto pacifista ("Au-dessus de la mêlée", 1915) e dois ciclos romanescos: "Jean-Christophe" e "L'Âme enchantée".

O importante romance em dez volumes de Rolland, "Jean-Cristophe", conta a história de um músico e compositor que se afasta do mundo e reflete sobre os seus muitos males. Não é um romance cômico. Está cheio até a borda daquilo que Rolland acredita ser a pior tragédia do mundo: a chacina de animais para comer. Escreve Rolland:

Com toda veemência de sua (...) natureza, [Cristophe] sondou as profundezas da tragédia do universo: ele sofria todo o sofrimento do mundo e ficara, ensangüentado, em carne viva. Olhava os olhos dos bichos e via uma alma como a sua, uma alma que não sabia falar; mas os olhos gritavam por ela:
O que te fiz? Por que me feres?
Ele não suportava ver as coisas mais ordinárias que vira centenas de vezes – um bezerro chorando num cercado, com olhos grandes e esbugalhados, de branco azulado e pálpebras rosadas, e pestanas brancas, os tufos de pêlo branco e encaracolado na testa, o focinho arroxeado, as pernas ainda trêmulas; – um cordeirinho sendo carregado por um camponês com as quatro patas amarradas, de cabeça para baixo, tentando manter a cabeça levantada, gemendo como uma criança, balindo e esticando a língua cinzenta; – aves amontoadas num cesto; – os guinchos distantes de um porco sendo sangrado; – um peixe a ser limpo na mesa da cozinha... As torturas inomináveis que os homens infligem a estas criaturas inocentes faziam doer o seu coração. Concedei aos animais um vislumbre de razão, imaginai que pesadelo apavorante é, para eles, o mundo: um sonho de homens de sangue-frio, cegos e surdos, que lhes cortam a garganta, abrem-lhes o peito, evisceram-nos, cortam-nos em pedaços, cozinham-nos vivos, às vezes rindo-se deles e de suas contorções enquanto padecem em agonia. Há coisa mais atroz entre os canibais (...)? Para um homem cuja mente é livre há algo de mais intolerável no sofrimento dos animais do que no sofrimento dos homens. Afinal, no caso destes últimos, pelo menos se admite que o sofrimento é cruel e que o homem que o causa é um criminoso. Mas milhares de animais são abatidos inutilmente todos os dias sem sombra de remorso. Se algum homem se referisse a isso, seria considerado ridículo – e este é um crime imperdoável. Esta, sozinha, é a justificativa de tudo o que os homens sofrem. Exige a vingança de Deus. Se existe um Deus bom, então até a mais humilde das coisas vivas deveria ser salva. Se Deus é bom somente com os fortes, se não há justiça para os fracos e inferiores, para as pobres criaturas que são oferecidas em sacrifício à humanidade, então não existe esta tal bondade, esta tal justiça...

Palavras contundentes, que até hoje apelam à nossa sensibilidade.

segunda-feira, 21 de setembro de 2009

A triste história do pequeno Linguiça de Vitela

São simples, mas eu adoro estes versos!
Abraços!

(Daniel Kirjner)

Fecundou
a mão humana o sexo,
em esturpo assistido.

Gestou
por nove meses, a escrava
do leite que é vendido.

Nasceu
por entre vidas em série,
condenadas ao deszelo.

Comeu,
sem sugar seio de mãe,
o anêmico Vitelo.

Engordou
forçadamente entupido
de líquido amido.

Viveu
preso em fétido cárcere,
nem longo, nem comprido.

Moveu
tão pouco as frágeis juntas
que seu corpo amoleceu.

Chorou
a falta de amor no rosto
distorcido pelo breu.

Persisitiu
sofrendo vários meses
de tortura, o bebê.

Existiu
por entre penas duras,
e esqueceu de adormecer.

Morreu
fendido pela lâmina sangrada,
do carrasco de ofício.

Esfolou,
sem dó, seu corpo,
a mão febril do genocídio.

Pesou
aquele cádaver infantil
o executor pecuarista.

Vendeu
a vida a preço barato,
em usura atacadista.

Correu
estradas o caminhão,
refrigerado pela morte.

Chegou,
enfim, na capital,
aquele triste e vil transporte.

Pendurou
seu corpo inerte
entre ganchos, o açogueiro.

Entregou
a um cozinheiro
por migalhas de dinheiro.

Cozinhou
o pequeno corpo,
assassinado em sofrimento.

Serviu
a alguns humanos
em dia de casamento.

Aconteceu
que não foi este
o único fim de sua morte.

Partilhou
com vários corpos
o ardil de outra sorte.

Condensou
o fabricante de lingüiça
todo mal.

Serviu
como iguaria
em um bar medieval.

Houve
jamais quem nomeasse,
quando vivia, tal bezerro.

Fez
o Homem de um prato de comida
seu enterro.

Transformou,
sem piedade, os pequenos
em estrela.

Devorou
restos de meninos,
ou Linguiça de Vitela.

quinta-feira, 17 de setembro de 2009

A Dualidade da Relação Homem-Animais (Também) na Literatura


Muitas questões básicas têm ecoado nas mentes humanas desde que o primeiro homo sapiens pisou sobre a Terra e, portanto, são temas frequentes na literatura: a inexorabilidade da passagem do tempo, a imprevisibilidade da morte, o enlevo proporcionado pelo enlace amoroso, a veleidade das relações humanas, as injustiças inerentes aos diferentes modelos de organização social, etc. Outro tema recorrente, embora menos visível, é o da relação entre o ser humano e as outras espécies de animais (sim; mesmo que faça todos esforços para se afastar de sua classificação taxonômica, o homem é apenas mais uma das tantas espécies animais que habitam nosso planeta).

O pensamento humano acerca dessa relação é marcado por uma clara dualidade: de um lado, erguem-se as vozes que defendem a utilização dos demais animais pelo homem, de maneira menos ou mais exploratória, mas sempre justificada por uma diferença de status moral entre “nós” e “eles”, sendo, assim, o nosso ato de comê-los plenamente justificado; do outro, aquelas vozes que advogam direitos morais básicos aos animais não-humanos, direitos tais como o direito à vida, à integridade física, à liberdade (e, é claro, uma conseqüência direta da observância de tais direitos seria nossa renúncia à utilização dos demais animais como meios para nossos fins, sejam esses fins quais forem, até mesmo gastronômicos).

Essa dicotomia, que aparece nos mais diferentes contextos, inclusive na literatura, é a rigor, uma herança filosófica helenística.

Vejamos os pensadores que estão de um lado dessa contenda.

No século VI a.C., Pitágoras, filósofo e matemático, já falava sobre respeito animal em sua obra “Do consumo da carne”, pois acreditava na transmigração de almas. Ou seja: de acordo com Pitágoras, os animais não-humanos são seres humanos reencarnados. Por isso, a justiça e a compaixão demonstradas a vacas e porcos são justiça e compaixão demonstradas a seres humanos. O pensamento pitagórico foi seguido também por Sócrates e por seus discípulos, incluindo Platão. Assim, filósofos neo-platonistas vieram também a advogar a dieta vegetariana. Um exemplo é Porfírio (233-306 d.C.), que adota uma postura vegetariana, porém com um embasamento mais moderno em sai obra “Da abstinência”. Ele defende que os animais não-humanos merecem consideração moral devido àquilo que são (criaturas sensíveis e conscientes) e não devido ao que não são (seres humanos aprisionados em corpos de animais). O que mais espanta Porfírio não é que pessoas como ele optem por não comer carne, mas sim que alguém tenha optado por fazê-lo:

Quanto a mim (...) pergunto-me por que acidente e em que estado da alma ou da mente o primeiro homem que o fez tocou o sangue com sua boca e levou os seus lábios à carne de uma criatura morta, aquele que pôs à mesa corpos mortos e fétidos e aventurou-se a chamar de nutrição os pedaços que um pouco antes bramiam e gritavam, moviam-se e viviam. Como puderam seus olhos suportar o massacre de se cortarem gargantas, de se esfolar o couro, de se arrancar um membro de outro membro? Como pôde o seu nariz agüentar o fedor? Como é que a imundície não causou repulsa ao paladar daquele que fez contato com as feridas de outros e sugou fluidos e soros de ferimentos mortais?

Por sua vez, o ensaísta romano Plutarco (56-120 d.C.) escreveu em seu “Do consumo de carne”:

Mas, em prol de algum bocadinho de carne, privamos uma criatura inocente do sol e da luz e daquela porção de vida e tempo que ela veio ao mundo para gozar.

E quem encontramos defendendo, na Antiguidade Clássica, a posição contrária?

Temos, por exemplo, Aristóteles, que escreveu, no século IV a.C., argumentando que os animais estavam distantes dos humanos na Grande Corrente do Ser ou escala natural. Alegando irracionalidade, concluía, assim sendo, que os animais não teriam interesse próprio, existindo apenas para benefício dos seres humanos.

A partir dessas duas linhas de pensamento sobre a relação homem-animal, a linha pitagórica e a linha aristotélica, dividiram-se os pensadores nos séculos seguintes.

No século XVII, o filósofo francês René Descartes (1596-1650) argumenta que animais não têm almas, logo não pensam e não sentem dor, sendo assim os maus-tratos não eram errados. Contra isso, Jean-Jacques Rousseau (1712-1778) argumenta, no prefácio do seu “Discursos sobre a Desigualdade” (1754), que os seres humanos são animais, embora ninguém “exima-se de intelecto e liberdade”. Entretanto, como animais são seres sensíveis e conscientes, “eles deveriam também participar do direito natural”.

Também Voltaire (1694-1778) respondeu a Descartes no seu Dicionário Filosófico:

Que ingenuidade, que pobreza de espírito, dizer que os animais são máquinas privadas de conhecimento e sentimento, que procedem sempre da mesma maneira, que nada aprendem, nada aperfeiçoam! Será porque falo que julgas que tenho sentimento, memória, idéias? Pois bem, calo-me. Vês-me entrar em casa aflito, procurar um papel com inquietude, abrir a escrivaninha, onde me lembra tê-lo guardado, encontrá-lo, lê-lo com alegria. Percebes que experimentei os sentimentos de aflição e prazer, que tenho memória e conhecimento. Vê com os mesmos olhos esse cão que perdeu o amo e procura-o por toda parte com ganidos dolorosos, entra em casa agitado, inquieto, desce e sobe e vai de aposento em aposento e enfim encontra no gabinete o ente amado, a quem manifesta sua alegria pela ternura dos ladridos, com saltos e carícias. Bárbaros agarram esse cão, que tão prodigiosamente vence o homem em amizade, pregam-no em cima de uma mesa e dissecam-no vivo para mostrarem-te suas veias mesentéricas. Descobres nele todos os mesmos órgãos de sentimentos de que te gabas. Responde-me maquinista, teria a natureza entrosado nesse animal todos os órgãos do sentimento sem objetivo algum? Terá nervos para ser insensível? Não inquines à natureza tão impertinente contradição.

Além de filósofos, Rousseau e Voltaire eram também homens de letras, escritores, na acepção de criadores de obras de articulação e conteúdo estético (isto é, não estritamente argumentativo, lógico e racional, como é o discurso filosófico). Foi a partir deles, então, que surgiram e ganharam força de côro muitas e variadas vozes vegetarianas na literatura.

Conheceremos, de agora em diante, neste blog, algumas delas e o que elas podem nos ensinar, não exatamente através da razão, mas sim através da sensibilidade.

quarta-feira, 16 de setembro de 2009

A vegana arte de apreciar obras de arte

Autor: Dennis Zagha Bluwol
(Texto presente no Zine-Livro "Escritos Éticos & Picaréticos")

A vida vegana. Certeza de ser algo bom, mas ando sempre incomodado com o que aparece por aí. Tenho culpa eu se a normalidade é tão assombrosa? Sou ranzinza eu pela violência ter virado o status quo?
Adoro música clássica e às vezes vou a concertos, durante os quais, mesmo estando com a mente a anos-luz de distância, inebriado por todo aquele som, aquelas dezenas de instrumentos em acordo, levado por relevos sonoros inimagináveis, há sempre algo me cutucando os neurônios: esses arcos são feitos com crina de cavalo! Incômodo que não passa nem na mais delicada sinfonia. E fico pensando: o que mais deve haver de origem animal nesta orquestra? Será que essa flautista de gestos e expressões tão doces é uma devoradora de cadáveres? Será que eles festejam uma boa temporada com um grande churrasco? Será que a gentileza que transmitem na música existe no modo como convivem? Possuo uma amiga instrumentista que já tocou em orquestra. Disse-me que o ambiente das orquestras é o mais competitivo possível. Dói-me saber que gente que é capaz de expressar tamanha beleza possa ser tão vil e egoísta. E as crinas? Não há outro modo? Dizem que os materiais sintéticos não produzem um som tão bom. Mas vos pergunto: e o que o cavalo tem a ver com isso? Nunca vi um cavalo apreciador do impressionismo francês.
E os museus? Já me incomoda o fato de termos sido adestrados a achar normal que arte fique em museu, para ser analisada por meia dúzia de especialistas e discutida no café. Ou logo esquecidas. Mas, para mim, reles apreciador sem formação, além de tentar entender ou me libertar para sentir o que uma obra de arte pode me transmitir, fico pensando a cada quadro: será que esta tinta é de origem animal? Sei que na época medieval se fabricava tintas com ovos e pigmentos. Mas nunca vi uma galinha cubista. Já vi galinhas amontoadas em cubos de barras de ferro, mas cubistas, nunca.
E cinema? Adoro cinema. Mas e as películas dos filmes cinematográficos? São feitas com gelatina de origem animal. Tutano de boi assassinado. Já vi um boi que lembrava o Woody Allen, mas isso não me deixa menos preocupado. Agora há cinema digital, mas muitos acham que não é a mesma coisa. Pessoalmente, não sei, mas creio que os bovinos não estão muito ligados nas possibilidades de fotografia nas diferentes mídias.
Mas não pense que essa preocupação é de caráter esnobe: concertos, museus... E no sambão? Também gosto de um bom samba, mas e toda aquela percussão feita de pele? Não há como justificar. Falar em pandeiro com pele de gato, além do sempre companheiro do samba, o churrasquinho, que pode também ser de felino, são já piadas consagradas, quando não realidades. Não sei o que é pior.
A violência é tão arraigada em nossa cultura que não se pára para questioná-la. Na verdade, ela não é nem percebida. Seres vivos e sencientes facilmente viram arcos de violino, tambores, pandeiros, tintas, filmes fotográficos. Que espécie de arte é esta? Nazistas faziam belos abajures com pele de judeus. Ingleses fizeram belas bolsas para tabaco com saco escrotal de aborígines tasmanianos. Nós fazemos belos filmes com tutano de boi e belas sinfonias com crina de cavalo. E eu não vejo uma diferença substancial. A violência é a mesma. Só as espécies que mudam. E isto não justifica uma alteração de moralidade.
Ei, sapateador, esses sapatos são de couro, não?

terça-feira, 15 de setembro de 2009

O Parlamentar e o Cavalo

Daniel Kirjner

Luiz Amâncio não passava de um político indigestamente ordinário; daqueles com a falácia adestrada para o ofício parlamentar. Seus caprichos eram tão mundanos como secretos. Nunca havia sido condenado nem por afanar chicletes, apesar de sua consciência ter olvidado delitos piores. Naquela terça-feira de junho, em rotina rara para os deputados federais, foi trabalhar na Câmara. Talvez, nem em seus sonhos menos medíocres tivesse projetado o que estava por acontecer.


Adentrou ao congresso com a convicção de que contaria algumas mentiras, reforçaria “amizades”, para depois mergulhar no luxo de uma vida mansa. Trabalhar era como ir ao dentista: um mal bimestral e necessário, com fins de preservar a fachada. Mas a melhor justiça, mesmo que rara, é produto do acaso. Vejam vocês que, durante o discurso de Luiz Amâncio sobre um reajuste aos servidores do executivo, algo de inexplicável aconteceu: passos decididos como de cascos batendo no chão soaram, rompendo por sobre a sua fala. Mesmo com tamanho eco que ostentava a casa da lei federal, jamais se havia ouvido nos corredores ruído parecido, como patas de cavalo marchando sobre granito. Amâncio não pode continuar discursando com o barulho incômodo, tendo espichado o olhar para ver o que, ou quem, era responsável pelo barulho de cavalaria.

A resposta para essa pergunta deu-se em segundos, e qual não foi a surpresa de seu óbvio conteúdo: tratava-se, factualmente, de uma cavalaria. Mas não era qualquer uma! Aquela que adentrava ao Congresso Brasileiro não era montada por cavaleiros ou amazonas, mas rumava independente por sobre as salas oficiais do poder instituído. Eram cavalos únicos; todos os vinte que desfilaram na sessão plenária com autênticos ternos Armani. Luiz Amâncio, velho deputado e pecuarista, pensou que aquilo era uma piada da oposição. Contudo, essa impressão foi logo abatida pelo inesgotável estarrecimento causado pela primeira frase pronunciada pelo equino que se destacava à frente:

- Boa noite, senhores Deputados dessa ilustre Casa.

Quem pensa que houve o mais discreto ensaio de resposta ao cavalo, engana-se. Nenhum parlamentar, assessor, guarda ou funcionário da limpeza ousou dizer palavra. O justificado transe coletivo era tão material quanto as paredes da sala. Alguns ilustres políticos brasileiros, conhecidos pelo carisma e austeridade, chegaram a salivar compulsivamente, em sinal de estado de choque. Mas tal impacto não impediu o cavalo de prosseguir, apesar de mostrar-se bastante encabulado com a situação:

- Creio que Vossas Senhorias não estão muito acostumadas com minha espécie de interlocutor. Bem, para falar a verdade, nem sei ao certo como consigo expressar-me, modéstia à parte, tão bem. O fato é que até ontem eu relinchava pelado e hoje venho aqui, papear em tão ilustre Casa, trajando terno e óculos escuros.

Tomado de uma valentia, imbuído pela impulsividade, Luiz Amâncio enfim questionou o chefe dos cavalos. Indagou, revoltado, sobre que armação estava acontecendo, se aquilo era algum tipo de brincadeira sem graça. Ainda efusivo, bradou aos quatro ventos que esse tipo de palhaçada enfraquecia a democracia, pois brincadeiras assim não deviam ter lugar onde nascem as leis. O cavalo, calmamente, respondeu:

- Tenho orgulho de ser um animal e, apesar de não ter muita prática em discursar, o faço de maneira séria e responsável.

O parlamentar retrucou com o argumento que julgava mais sensato: o de que era fazendeiro desde que nascera e tinha certeza de que cavalo não falava! Tal frase gerou uma risada debochada entre a peculiar cavalaria, que preencheu todo o salão. E, para ironizar o deputado, o grupo de animais entoou – em coro – o “Hino à Bandeira”, de Olavo Bilac e Francisco Braga; aquele mesmo, do “pendão da esperança”. Amâncio não pode conter uma discreta inveja ao constatar que aqueles seres não só falavam com grande desenvoltura, como eram mais patriotas e versados que ele. Constatando o impacto daquela solene canção, o cavalo que estava à frente retomou a palavra:

- Poderíamos continuar por mais alguns minutos e cantar o Hino Nacional, o da Independência e – quem sabe – até um sucesso de Roberto Carlos, mas não é para isso que viemos. Na verdade, nosso fim em tão ilustre Casa é bem mais político que performático. Como os senhores ainda ignoram, não somos nós apenas os animais não humanos que sabem falar. Se saírem à rua no dia de hoje verão que todos, desde os pequenos répteis até as vacas, têm a capacidade de se comunicar verbalmente. É inútil perguntar a qualquer um de nós o motivo de tal acontecido, nem o engenho que nos tornou assim, pois não fazemos a menor idéia. O certo é que todos acordamos nesta madrugada entupidos de cultura, no sentido mais antropológico da palavra - antropologia tal que, em vista dos fatos, terá de ser renomeada. A única coisa que vos asseguro ao certo é que o excelente gosto para roupas é privilégio dos cavalos, apesar de nossa pele já ser um estouro!

Novamente, o carismático líder provocou o riso relinchado de seus correligionários. Luiz Amâncio, simplesmente embasbacado, fez um esforço colossal e demorado para, no microfone, pedir que aquela bela peça de montaria, em sua concepção, prosseguisse. O cavalo, atendendo ao reclame do parlamentar, continuou:

- Pois bem, Senhores, agora, que todos já sabem (ou ainda não compreenderam) o que acontece, irei apresentar quem vos fala. Nós somos os Houyhnhm, nome inspirado em uma grande estirpe criada na literatura humana infantil. Fomos eleitos pelos representantes de todos os animais, em pleito democrático, para aqui, neste recinto, falar e reivindicar algo que deveria ser direito de todos. Creio que tal vitória nas urnas não é fruto apenas de nossas habilidades políticas, mas sim de uma certa admiração que – apesar de não se traduzir exatamente em respeito – sua espécie tem pelos cavalos. Se aqui aparecessem cachorros ou coelhos, outros seres afetivamente ligados aos humanos, provavelmente seriam tratados como crianças pequenas e jamais poderiam propor coisa alguma. Quanto aos animais selvagens, hoje são por demais raros para assumirem o risco da viagem que empreendemos. As galinhas e bois, por medo de Vossas Excelências, não se candidataram e – por serem a maior parte dos representantes – coube a nós apenas a promessa de dar voz a suas causas para sermos eleitos. Fato é que nossa demanda é bastante simples: queremos representação legal, na Constituição deste ilustre Estado, para podermo-nos defender de pessoas ditas humanas. Na Carta Magna deste ilustre País, somos somente designados como parte do ecossistema e, apesar de estar lá estabelecido que não devemos ser maltratados, a escravidão e a exploração dolorosa são institucionalizadas e fomentadas pelo Governo. Portanto, como somos seres sencientes, capazes de todos os sentimentos possíveis e alguns novos incutidos pela dor, reivindico Emenda Constitucional! Que todos os animais tenham individualidade e capacidade de representação legal em qualquer instância desta República!

Luiz Amâncio, pecuarista radical e político experimentado na arte do convencimento, não pode escutar aquilo inerte e, nesse momento, vislumbrando a ameaça ao seu estilo de vida, intercedeu. Afirmou que os tribunais já andavam abarrotados somente com causas humanas; que a Câmara se afogava em projetos pendentes e mal conseguia votar o Orçamento da Nação. Tomado pela coragem que o desespero fomenta em uma presa ameaçada, o deputado apontou o dedo na direção dos cavalos e indagou, bradando, sobre quem eram os animais para aparecerem de repente e reivindicar algo que as pessoas tanto tempo levaram para construir. Ao ouvir tal pergunta, a comoção tomou conta dos equinos. O Houyhnhm chefe, que agora ofendera-se profundamente, com lágrimas escorrendo por sua larga face, respondeu emocionado:

- Vocês querem saber se temos direito de reivindicar algo? Pois bem! Não queria apelar para o sentimentalismo, nem para o choque que a injustiça causa nos seres que têm compaixão. Mas como esse homem não faz menção de demonstrar respeito, falarei o que há muito tempo calamos, pelo simples fato de – mesmo sentindo cada sensação – não soubemos como expressar! Querem saber quem somos, ilustres parlamentares? Somos aqueles que, por séculos a fio, carregamos a Humanidade nas costas, entupidos por arreios apertados, chicoteados ao mínimo sinal de cansaço. Também fomos atração de rodeios! Molestados em um estranho ritual humano. Eu posso dizer, caro senhor, que minha genitália foi amarrada com fim de causar-me espasmos de dor. Tudo isso para que um cowboy passasse alguns segundos sobre minha costas e uma multidão de hipócritas ensandecidos risse de minha desgraça. Esse mal não é só meu! Também foi partilhado por bois que, de tão traumatizados pela dor, não puderam se apresentar aqui, em face de Vossas Excelências, assim como não vieram as galinhas de granja, privadas violentamente de seus bicos para que não se matem no desespero de um recinto fechado que abriga tantos animais, onde muitos não sabem como se mover e só puderam ver a luz solar como um borrão, na iminência da morte. Perecem, talvez neste momento, porcos urrando de dor, como se seus pulmões sangrassem em gritos pela vida. Isso sem mencionar o estupro, prática tão desprezada até pelos criminosos de sua espécie. Para assegurar a produção em série de cavalos, vacas, galinhas e porcos, entre outros, as genitálias de nossos pais foram violadas e manipuladas sem consentimento, muitas vezes sob profunda dor. O leite e o ovo que vossa sociedade consome vem de seres mantidos em constantes gestações, sofrendo o impacto disso em seus corpos, para alimentarem outros que não seus filhos. Por essas e outras que pedimos justiça, ou pelo menos um direito de resposta aos males que nos afligem!

Luiz Amâncio, tomado de cólera, grita indignado que aqueles animais desejavam a morte humana! Colocou que era absurda a idéia de uma nutrição saudável composta somente por vegetais e que as pessoas fazem todas aquelas coisas porque elas são da maior importância cultural e alimentícia. O cavalo, teimando em segurar o pranto que provinha da lembrança de anos de sofrimento, retrucou, fingindo calma:

- Não só é possível para um humano alimentar-se e ser feliz sem a nossa dor, como muitos dos seus já vivem dessa forma. O que peço, sem retribuir a violência que nos foi dada, é que, daqui por diante, os senhores passem a respeitar o que diz sua própria Constituição, como primeiro passo para que, em um breve futuro, sejamos não apenas parte do ecossistema, mas indivíduos perante a Lei. Creio que, agora que possuímos as faculdades da fala e do entendimento, e, como diria Kafka por meio de Pedro Rubro, temos a “inteligência de um europeu normal”, seja-nos permitido pelo menos o privilégio de não sentir dor e o direito de ir e vir.

Nesse momento, oficiais do DOE invadiram o Congresso, alvejando a balas todos os Houyhnhm. Luiz Amâncio foi tomado por um alívio profundo por ver findado, pelo menos por ora, o medo que lhe preenchia. Quanto à compaixão pelos virtuosos cavalos, não teve. Já era seu costume eliminar, com as próprias mãos, a vida de outros daquela espécie que ficavam velhos e não mais serviam de montaria. Em sua cabeça, a lógica era quase a mesma: aqueles cavalos morreram porque ficaram por demais inteligentes e não mais serviam de montaria. O que aconteceu depois desse evento não me cabe relatar aqui, neste diminuto conto. Mas não finalizarei esta prosa sem dar uma pista do futuro: muito mais havia para ser dito e, mais ainda, para ser ouvido.

Daniel Kirjner

Blog de Literatura Vegana!

Olá amigos, veganos ou não! É com maior prazer que inauguro presente espaço com o texto "O Parlamentar e o Cavalo", no qual iremos expressar em forma de arte as mazelas de nossa causa. Este blog tem por fim dar voz a um outro viés argumentativo da defesa dos animais; um que prime por atingir as pessoas através do sentimento, e não da razão. Se você é vegano e se aventura em alguns escritos pela causa dos animais, adentre o nosso grupo, enviando um e-mail para resistenciavegana@gmail.com. Temos também um Twitter no qual os autores podem postar inspirações mais confucianas: o ResistenciaVEG. Lembrando sempre que este diário é uma iniciativa do Núcleo de Estudos Vegetarianos de Brasília, associado à SVB.

Um abraço! Desejo à todos, desde já, divertidas, emocionantes e inspiradoras visitas ao Resistência!